PARECER TÉCNICO Nº 39/2015


08.09.2015

Legalidade do Técnico de Enfermagem realizar transferência inter-hospitalar de pacientes em ambulância tripulada apenas com condutor e transportar material biológico entre unidades hospitalares.

 

Fundamentação

 

O transporte inter-hospitalar refere-se à transferência de pacientes entre unidades não hospitalares ou hospitalares de atendimento às urgências e emergências, de diagnóstico, terapêutica ou outras unidades de saúde que funcionem como bases de estabilização para pacientes graves, de caráter público ou privado, e tem como finalidades a transferência de pacientes de serviços de saúde de menor complexidade para serviços de referência de maior complexidade e vice-versa (Portaria n. 2048/2002).

O transporte de material biológico no Brasil é regulamentado pela ANVISA, através da RDC n. 20/2014, a qual estratifica os materiais em três categorias e reforça que deve haver instruções padronizadas e pessoal treinado para esse fim.

 

Análise

 

De acordo com a Portaria n. 2048/2002, a viatura TIPO A ou Ambulância de Transporte é o veículo destinado ao transporte em decúbito horizontal de paciente que não apresenta risco de vida, para remoções simples e de caráter eletivo, devendo servir ao transporte de um paciente por vez.

Esse mesmo instrumento deixa claro que a responsabilidade da assistência ao paciente transferido é do médico solicitante, findando-a no momento em que o paciente é recebido pelo médico do serviço de destino, nos casos de transferência em viaturas de transporte simples (Tipo A).

As Ambulâncias de Transporte (Tipo A) devem ser equipadas minimamente com sinalizador óptico e acústico, equipamento de radiocomunicação em contato permanente com a central reguladora, maca com rodas, suporte para soro e oxigênio medicinal (Portaria MS n. 2048/2002).

Como forma de ampliar a segurança do profissional que realiza o transporte e do paciente que está sendo transferido, recomenda-se incluir nestas viaturas a maleta de primeiros-socorros, composta por cobertor, compressas cirúrgicas, gazes esterilizadas, ataduras, esparadrapo, máscara de oxigênio, luvas, máscara cirúrgica comum, ambu, avental de proteção, dentre outros.

A Portaria MS n. 356/2013, em seu anexo II, elenca a conformação das equipes que devem tripular os diversos tipos de ambulância. Para as ambulâncias do Tipo A, faz-se obrigatória a presença de condutor de veículo de emergência e um profissional de enfermagem (enfermeiro, técnico ou auxiliar de Enfermagem).

Contudo a Lei Federal n. 7.498/1986 (art. 15) e seu Decreto regulamentador n. 94.406/1987 (art. 13) são claros ao dizer que as atividades técnicas e auxiliares de enfermagem somente podem ser desempenhadas sob supervisão, direção e orientação do Enfermeiro.

A Portaria 2048 ainda elenca as atribuições de cada profissional envolvido no transporte inter-hospitalar, conforme abaixo:

 

1.1.1.2 – Enfermeiro: (…) Competências/Atribuições: supervisionar e avaliar as ações de enfermagem da equipe; …; prestar cuidados de enfermagem de maior complexidade técnica a pacientes graves e com risco de vida, que exijam conhecimentos científicos adequados e capacidade de tomar decisões imediatas (…)

 

1.1.1.3 – Técnico de Enfermagem: (…)assistir ao enfermeiro no planejamento, programação, orientação e supervisão das atividades de assistência de enfermagem; prestar cuidados diretos de enfermagem a pacientes em estado grave…

 

1.1.1.4 – Auxiliar de Enfermagem: (…) Competências/Atribuições: auxiliar o enfermeiro na assistência de enfermagem; prestar cuidados de enfermagem a pacientes …; prestar cuidados de conforto ao paciente e zelar por sua segurança…

 

Adicionalmente às atribuições supraditas, as Resoluções COFEN n. 358/2009 e 375/2011 determinam a realização do Processo de Enfermagem para o atendimento do paciente transportado.

No que tange ao traslado de material biológico para análises clínicas, para que o laboratório possa oferecer resultados confiáveis, não basta que as técnicas sejam executadas de forma correta e com pessoal treinado, é necessário que se utilize uma amostra biológica devidamente conservada, obtida em quantidade suficiente, em recipiente adequado, bem identificada e transportada de forma a manter a integridade do material a ser pesquisado.

Há três categorias principais de material biológico: I – Categoria A: material biológico infeccioso cuja exposição ao mesmo pode causar incapacidade permanente ou enfermidade mortal, pondo em risco a vida humana ou de outros animais sinalizada como UN 2814 ou UN 2900 se afetar somente animais; II – Categoria B: material biológico infeccioso que não se inclui na categoria A, classificado como “substância biológica de Categoria B” UN 3373, inserindo-se neste grupo amostras de pacientes que se suspeita ou se saiba conter agentes infecciosos causadores de doenças em humanos; e III – Categoria Espécime Humana de Risco Mínimo: adaptado do inglês “Exempt Human Specimen”, inclui materiais biológicos provenientes de indivíduos sadios que foram submetidos a juízo profissional baseado em história clínica, sintomas e características individuais, bem como nas condições endêmicas locais que asseguram a probabilidade mínima do material biológico conter microrganismos patogênicos, mesmo que estes materiais não tenham sido submetidos previamente a testes para marcadores de doenças transmissíveis pelo sangue, seguindo as diretrizes da Organização Mundial de Saúde (OMS).

O “MANUAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA SOBRE O TRANSPORTE DE MATERIAL BIOLÓGICO HUMANO PARA FINS DE DIAGNÓSTICO CLÍNICO” (2015) pontua alguns cuidados para essa atividade, como a etiquetagem correta das embalagens interna e externa, o acondicionamento em temperatura adequada à amostra transportada, o alerta de risco para substâncias infecciosas e a proteção adequada do profissional treinado que transporta.

O transportador é a pessoa física ou jurídica que efetua o transporte de material biológico entre a unidade de coleta e a unidade de análise. Quando for profissional do serviço, deve ser supervisionado por profissional capacitado e designado formalmente para desempenhar as atividades de monitoramento dos processos de transporte de material biológico. Tal supervisor pode ser de nível superior ou técnico.

A RDC n. 302/2005 define que o laboratório clínico e o posto de coleta devem possuir instruções escritas para o transporte de amostras de pacientes, estabelecendo prazo, condições de temperatura e padrão técnico para garantir a sua integridade e estabilidade. Desta forma, de acordo com as características do material biológico a ser transportado, é de responsabilidade do laboratório a garantia da qualidade da amostra a ser analisada.

Sabe-se que a coleta e a análise de material biológico fazem parte das atribuições dos profissionais de enfermagem, conforme preconizado no Decreto n. 94.406/1987. No entanto, o transporte desse material não está descrito na lei, o que não proíbe o profissional de enfermagem de realiza-lo, desde que as normas sejam observadas.

Compulsando a legislação da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), na descrição sumária das atribuições de cargos dos hospitais universitários federais, encontra-se que as atividades de laboratório, no âmbito desta instituição, são da competência dos profissionais Biólogo, Biomédico, Farmacêutico, Técnico em Análises Clínicas e Técnico em Citopatologia, enquanto que, para os profissionais de enfermagem, não há referência a estas ações:

Biólogo: Desenvolver atividades gerais de laboratório de análises clínicas e patológicas, como a coleta do material biológico (exclui-se aqui as coletas que são consideradas atos médicos), a execução dos testes, especialmente (mas não somente), análises citológicas, citogênicas, de biologia molecular e de citometria…

Biomédico: Atuar em equipes de saúde, a nível tecnológico, nas atividades complementares de diagnósticos; Analisar amostras de materiais biológicos, bromatológicos e ambientais; Coletar e preparar amostras e materiais; … Atuar em bancos de sangue e de células tronco hematopoiéticas; …

Farmacêutico: …Realizar análises clínicas, toxicológicas, fisioquímicas, biológicas, microbiológicas e bromatológicas; …

Técnico em Análises Clínicas/Técnico de Laboratório/Técnico em Laboratório de Patologia Clínica: Auxiliar e executar atividades padronizadas de laboratório – automatizadas ou técnicas clássicas – necessárias ao diagnóstico, nas áreas de parasitologia, microbiologia médica, imunologia, hematologia, bioquímica, biologia molecular e urinálise; …

Técnico em Citopatologia/Técnico em Citologia: Auxiliar e executar atividades padronizadas de laboratório – automatizadas ou técnicas clássicas – referentes aos exames microscópicos e avaliação de amostras de tecidos e células, utilizados no diagnóstico de tumores e lesões; …

Enfermeiro: Planejar, organizar, coordenar, executar e avaliar o processo e os serviços de assistência de enfermagem; Planejar, organizar, coordenar e avaliar as atividades técnicas e auxiliares de enfermagem nas unidades assistenciais; Elaborar, executar e participar dos eventos de capacitação da equipe de enfermagem; Implementar ações para a promoção da saúde; Participar da elaboração e execução de planos assistenciais de saúde do idoso, do adulto, do adolescente, da mulher e da criança nos âmbitos hospitalar e ambulatorial; Prestar assistência direta aos pacientes de maior complexidade técnica, graves com risco de morte e/ou que exijam conhecimentos de base científica e capacidade de tomar decisões imediatas; Participar e atuar nos programas de prevenção e controle sistemático de infecção hospitalar; Realizar e participar da prevenção e controle sistemático de danos que possam ser causadas aos pacientes durante a assistência de enfermagem; Participar de projetos de construção ou reforma de unidades assistenciais; Realizar demais atividades inerentes ao emprego.

Técnico em Enfermagem: Assistir ao Enfermeiro no planejamento, programação e orientação das atividades de enfermagem, na prestação de cuidados diretos de enfermagem em estado grave, na prevenção e no controle sistemático da infecção hospitalar, na prevenção e controle de danos físicos que possam ser causados a pacientes durante a assistência de saúde; Executar atividades de assistência de enfermagem na saúde do idoso, do adulto, da mulher, do adolescente, da criança e do recém-nascido, excetuadas as privativas do Enfermeiro; Prestar cuidados de enfermagem pré e pós operatórios; Circular em sala de cirurgia e instrumentar; Executar atividades de desinfecção e esterilização; Organizar o ambiente de trabalho e dar continuidade aos plantões; Trabalhar em conformidade às boas práticas, normas e procedimentos de biossegurança; Realizar demais atividades inerentes ao emprego.

 

Contudo, na área de Hemoterapia e Hematologia, observa-se que o Enfermeiro especialista, no âmbito da EBSERH, corroborada pela Resolução COFEN n. 306/2006, é responsável pelo serviço:

 

Planejar, executar, coordenar, supervisionar e avaliar os procedimentos de Hematologia e Hemoterapia nas Unidades de Saúde, visando assegurar a qualidade do sangue, hemocomponentes e hemoderivados; …

 

Considerando o Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem, é direito do profissional:

 

Art. 10º – recusar-se a executar atividades que não sejam de sua competência técnica, científica, ética e legal ou que não ofereçam segurança ao profissional, à pessoa, família e coletividade.

 

Além do mais, faz parte de suas responsabilidades:

 

Art. 12º – Assegurar à pessoa, família e coletividade assistência de enfermagem livre de danos decorrentes de imperícia, negligência ou imprudência.

 

Art. 13º – Avaliar criteriosamente sua competência técnica, científica, ética e legal e somente aceitar encargos ou atribuições, quando capaz de desempenho seguro para si e para outrem.

 

Conclusões

 

Diante do exposto, com base nos dispositivos legais citados neste parecer (Lei Federal n. 7.498/1986, Decreto regulamentador n. 94.406/1987, RDC ANVISA n. 302/2005, RDC ANVISA n. 20/2014, Portaria MS n. 2048/2002, Portaria MS n. 356/2013, Resolução COFEN n. 306/2006, Resolução COFEN n. 311/2007, Resolução COFEN n. 358/2009 e Resolução COFEN n. 375/2011) e outros, conclui-se que:

  • Não se encontrou na legislação atual nenhum dispositivo que diferencie as atribuições do profissional de enfermagem conforme seu vínculo trabalhista, portanto, qualquer que seja este (CLT, estatutário, contrato temporário, prestador de serviço), aplicam-se a Lei Federal n. 7.498/1986, o Decreto n. 94.406/198, as normativas da ANVISA e toda a legislação instituída pelo Sistema Cofen/Corens no desempenho de suas atividades profissionais;
  • Sabendo-se que, de acordo com a Lei Federal n. 7.498/1986 e seu Decreto regulamentador n. 94.406/1987, as atividades de enfermagem devem ser supervisionadas privativamente por enfermeiro, o transporte inter-hospitalar de pacientes deve ser feito exclusivamente com a presença desse profissional, em viatura devidamente equipada e após execução do Processo de Enfermagem, conforme as normas vigentes;
  • Sabendo-se que, de acordo com a Lei Federal n. 7.498/1986 e seu Decreto regulamentador n. 94.406/1987, as atividades de enfermagem devem ser supervisionadas privativamente por enfermeiro, caso o traslado de material biológico seja feito por profissional de enfermagem treinado para este fim, sua supervisão deve ser feita por enfermeiro também treinado para este fim.

 

S.M.J, este é o parecer.

 

 

Aracaju, SE, 08 de setembro de 2015

 

 

 

Dr. Lincoln Vitor Santos

COREN/SE 147.165-ENF

Conselheiro

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